Introdução
Qual o significado de Deus ter-nos criado a sua imagem e
semelhança? Qual a implicação para a vida cristã? Isto implica
somente em privilégio ou também em responsabilidade?
A visão e o entendimento que tivermos acerca de nossa
criação, certamente irão afetar a nossa cosmovisão e irá
determinar nossa agir no mundo.
Mais do que nunca se faz necessário entendermos tal
verdade, para que possamos participar de forma responsável da
criação de Deus e servi-lo no mundo criado.
Vamos refletir acerca de nossa criação e assim
verificar as implicações relacionadas a este ato glorioso de Deus.
1. Fomos criados de uma maneira especial
Quando estudamos o registro acerca da criação de Deus
de todas as coisas e seres vivos, que está em Gênesis 1 e 2
percebemos que o homem foi criado de uma maneira diferente. As outras
coisas e criaturas foram criadas pela simples ordem de Deus: “Disse
Deus: haja luz; e houve luz... E disse Deus: Haja firmamento... Disse
também Deus: Ajuntem-se as águas... E disse: Produza a terra...
Disse também Deus: Haja luzeiros... Disse também Deus: Povoem-se as
águas de enxames de seres viventes; e voem as aves... Disse também
Deus: Produza a terra seres viventes... animais domésticos, répteis
e animais selváticos...” (Gn 1.3, 6, 9, 11, 14, 20 e 24). Contudo,
quando cria o homem, não o faz por uma simples ordem, e sim através
de um entendimento, um conselho, de Deus com Ele mesmo. Lemos em
Gênesis 1:26: “Também disse Deus: Façamos o homem à nossa
imagem, conforme a nossa semelhança...” Isto não é dito quando
Deus criou os outros seres. A expressão verbal “façamos”, está
na primeira pessoa do plural. Isto indica a pluralidade de pessoas em
Deus. Prova-nos, juntamente com outros textos bíblicos, que em Deus
há três pessoas, Pai, Filho e Espírito Santo. Na criação do
homem, Deus se aconselha consigo mesmo. As três pessoas da Trindade,
em entendimento entre elas, resolvem criar o homem e mulher, a sua
imagem e semelhança. Calvino diz que: “Até aqui Deus tem se
apresentado simplesmente como comandante; agora, quando ele se
aproxima do mais excelente de todas as suas obras, ele entra em
consulta".1
Na criação do homem e mulher, Deus se envolve mais
pessoalmente. No relato mais detalhado acerca da criação do homem e
mulher, em Gênesis 2:4-20, Deus forma o homem do pó da terra e
sopra nele o fôlego de vida. A mulher é criada da costela de Adão.
Quando Deus cria os outros animais, ordena que eles sejam criados, já
com respeito ao homem e mulher, Ele mesmo, forma do pó, sopra o
fôlego de vida, toma da costela e etc. Isto serve para demonstrar,
nossa dignidade, nosso valor para nosso Deus. Fomos criados de uma
maneira especial e maravilhosa. Na criação do homem Deus estabelece
um vínculo muito íntimo de relacionamento.
2. Fomos criados com habilidades especiais
Somos diferentes no que diz respeito às
habilidades atribuídas a nós. Somente o homem e a mulher, foram
criados a “imagem e semelhança” de Deus.2
Estas duas palavras são sinônimas, enfatizando que a humanidade é
uma imagem que é semelhante a Deus mesmo. Quando dizemos que somos
a imagem e semelhança de Deus, não estamos falando da aparência
física, pois Ele é Espírito (Jo 4:24). Estamos falando das
habilidades, que o homem recebeu e que refletem o ser de Deus, sendo
elas:
a) Justiça e retidão: O homem foi criado justo, reto,
sem pecado, bom, assim como é Deus.
b) Personalidade: O homem é um ser que possui
personalidade própria, possui individualidade. Cada pessoa tem o seu
temperamento, preferências, desejos, diferentes de outras. Por causa
dessa característica que possuímos, podemos também nos relacionar
com outras pessoas e com Deus.
c) Liberdade: Deus criou o homem com
liberdade para escolher. Podia escolher entre obedecer a Deus ou não.
d) Conhecimento Espiritual: O homem tinha compreensão
exata acerca de Deus.
e) Imortalidade: Foi criado para viver eternamente.
Embora, o pecado tenha produzido a morte, o homem nunca deixa de
existir.
f) Espiritualidade: Tinha a capacidade de estar em
comunhão com Deus. Esta comunhão não tinha o obstáculo do pecado.
g) Domínio sobre a natureza: Homem e mulher eram
gerentes, administradores de Deus, deveriam cuidar do jardim,
cultivar a terra, dominar sobre os animais e cuidar de toda a
criação.
h) Inteligência, razão e afeições: as ações do
homem são determinadas pelo raciocínio, razão e sentimentos,
enquanto que as ações dos animais são determinadas pelo seu
instinto natural.
Com todas estas habilidades, o homem espelha a Deus. É
claro que, com a queda do homem pela desobediência (Gn 3), esta
imagem e semelhança foi deformada. Contudo, mesmo depois da queda,
o homem continua a ser a imagem de Deus (Gn 9.6 e Tg 3.9). Esta
imagem, que foi deformada pelo pecado, através de Cristo, ela é
transformada, restaurada, gradativamente. Aqueles que crêem em
Cristo, estão sendo transformados a semelhança de Cristo, ou seja,
a semelhança de Deus (Rm 8.29; 2Co 3.18).
Somos de fundamental importância no atuar do reino de
Deus. Não recebemos habilidades tais, para usarmos a nosso bel
prazer e sim, para refletirmos diante da criação a imagem de Deus.
3. Fomos criados para um papel especial
Somos diferentes também, no que diz respeito ao papel
que desempenhamos.
Homem e mulher foram criados para espelhar, refletir,
imitar a Deus. Foram criados para serem representantes de Deus, seus
administradores. Como já nos referimos acima, eles deveriam dominar
sobre a criação, cuidar do jardim, cultivar a terra, dar
continuidade a raça humana através da procriação e etc. As
habilidades que receberam de Deus, deveriam ser usadas neste
importante papel, de espelhar e representar a Deus.
É importante enfatizarmos que, tal papel continuou
sendo válido, ou seja, continuou sendo um dever ordenado por Deus
para ser obedecido, mesmo depois da queda. É claro que, depois da
queda, homem e mulher, já não podem mais, exercer este papel com
perfeição, contudo aqueles que são de Cristo, por que estão sendo
transformados, podem melhor cumprir este papel, de tal forma que a
imagem de Deus é refletida de uma maneira mais clara.
Este papel deve ser desenvolvido, em três
relacionamentos diferentes, mas que contudo envolvem todo o nosso
viver neste mundo:
1. Relacionamento social: Homem e mulher, devem se
relacionar, constituir família, criar filhos, e desta forma, vivendo
em harmonia devem espelhar a Deus. Este relacionamento se estende a
todas as pessoas. Por isso, vemos que em toda parte da Bíblia, somos
incentivados a desenvolver um bom relacionamento, a expressar
respeito, amor, para com os nossos semelhantes; sejam eles os
familiares (Gn 2.20-25; Sl 128; Ef 5.21-6.4), o próximo (Mt
22.34-40; Rm 12.9, 10, 17 e 18), os inimigos (Mt 5.43-47; Rm 12.14,
19, 20 e 21) ou irmãos em Cristo (Gl 6.10; 1Jo 3.11-24).
2. Relacionamento cultural: Ao homem cabe a tarefa de
dominar, administrar a criação de Deus (Gn 1.26-29; 2.15-17). Este
relacionamento envolve os aspectos, político, educacional,
comercial, de trabalho, artístico, tecnológico, de recreação.
Tudo pertence a Deus, cada aspecto deste mundo, desta forma, devemos
em tudo ser fiel ao nosso Deus e fazer o melhor para Ele, honrando-o
e glorificando-o (Ef 6.5-9; 1Co 10:31).
3. Relacionamento Espiritual: Desde a sua criação,
Deus tem chamado o homem a um relacionamento que, envolve a
obediência. Adão e Eva no Éden, deveriam obedecer a ordem dada a
eles de não comer da árvore do conhecimento do bem e do mal.
Conforme o relato de Gênesis 3:1-7, eles desobedeceram este
mandamento e assim o relacionamento espiritual foi quebrado. Contudo,
logo em seguida (Gn 3:15), Deus anuncia a vinda daquele (Cristo)
que, viria para destruir o poder do diabo e restaurar este
relacionamento quebrado (Rm 5.1-11). Em Cristo Jesus e através dele
temos a comunhão com Deus restaurada e somos chamados para viver em
obediência a Ele. Este relacionamento ou comunhão com Deus, é
também exercido com todos aqueles que fazem parte da Igreja de
Cristo.
Somos especiais, com um papel importantíssimo, ou seja,
espelhar a Deus, representá-lo, diante de todo o mundo, de toda a
criação.
Percebam que privilégios geralmente são seguidos por
responsabilidades. Fomos criados diferentes de todas as criaturas e
temos também a responsabilidade de administrar, cuidar do que Deus
criou.
Estamos debaixo de um pacto com Deus, onde nos é
exigido obedecer os mandatos da criação, pois para isso é que
fomos criados.
Conclusão
Vimos como Deus nos criou de uma maneira totalmente
especial, no contexto do reino da criação, com a função de que em
cada área da vida possamos nos desenvolver, administrando sua
criação.
Precisamos evitar o desequilíbrio, em dar atenção ao
cumprimento de um mandato e não dar atenção ou desenvolver os
outros.
Deus não nos criou para ser
individualistas, mas, para nos aplicarmos a beneficiar toda a criação
para sua glória.
Que possamos cumprir nosso papel no mundo,
em todas as áreas, de forma adequada, glorificando a Deus.
1
Citação extraída do trabalho A Imagem de Deus no Homem segundo
Calvino, da Academia Calvinia.
2
Em nossos dias vemos um cuidado exagerado com os animais domésticos.
Pessoas gastam fortunas para dar conforto e saúde a seus animais de
estimação. Outras protestam e até mesmo destroem patrimônio
alheio alegando defender os direitos dos animais. Não sou contra a
proteção de animais, tampouco contra alguém cuidar de forma
adequada de seu animalzinho, dar a melhor ração, levar ao
veterinário, aliás, na minha opinião se você tem um animal de
estimação, então cuide adequadamente ou dê para alguém que vai
cuidar. Sou contra alguém maltratar um animal. Na minha opinião se
alguém maltrata um animal, ou o submete a tortura, deve ser
responsabilizado até mesmo criminalmente. Sendo assim, deixo bem
entendido, que sou contra o exagero e a dimensão que toma as causas
em defesas de animais. Por outro lado vemos outros defendendo por
exemplo, o aborto e o uso de embriões humanos em pesquisas
científicas, e tal posição parece ser aceita por muitos e ganha
proeminência da mídia. Tudo isso indica um desiquilíbrio. Dá-se
mais valor a vida animal do que a vida humana. Realizar pesquisas
com animais é considerado inaceitável e desumano e até mesmo
desnecessário, mesmo que seja com o fim de produzir medicamentos
que prolongue a vida humana. Por outro lado, aceita-se a realização
de pesquisas com embriões humanos, afinal de contas, defende-se que
é com o fim de trazer a cura e prolongar a vida humana. Há outros
que defendem o aborto, alegando que a mulher deve decidir, se lhe é
conveniente ou não ter um filho. Perdemos assim de vista o valor e
a dignidade humana atribuídas a nós pelo Criador. A vida animal é
tratada com mais respeito, do que a vida humana. A que ponto
chegamos? Salvar um animal se tornou uma ato mais humano, do que
defender a vida humana embrionária, ou ser contra a interrupção
de uma gravidez. As leis são cada vez mais rígidas para quem mata
um animal (pior se for silvestre) do que para alguém que mata uma
pessoa, um homem ou uma mulher feitos a imagem e semelhança de
Deus.